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8 de março de 2023 ESG

Energias renováveis: Presidente da Abeeólica destaca necessidade da participação feminina em toda cadeia produtiva

Em 2021, segundo dados da Agência Internacional para as Energias Renováveis (IRENA), mais de 700 mil novos empregos foram gerados na área de energias renováveis.  O cenário, além de acompanhar o debate sobre a transição energética, traz uma discussão ainda recente: a representatividade feminina e a busca pela equidade de gênero no setor de energias alternativas. Embora avanços significativos tenham ocorrido na área, Elbia Gannoum, presidente Executiva da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), defende que a equidade de gênero, a inclusão e a diversidade nesse segmento só serão possíveis quando conseguirmos enxergar as mulheres ao longo de toda a cadeia produtiva, ou seja, ocupando quaisquer funções que almejam.

Nas palavras dela, trata-se de um trabalho que exige tanto o envolvimento de empresas  investidoras quanto das instituições e a sociedade como um todo. Isso porque, fora a concentração de medidas com potencial de promover a participação feminina no setor, é preciso pontuar que esse ingresso deve englobar diferentes formas de atuação.  No campo eólico, em especial, o principal desafio é a preparação das mulheres para o mercado de trabalho, dado o papel da capacitação e formação de mão de obra feminina para a inclusão de mulheres nas energias renováveis.

“Quando falamos de postos mais altos, como níveis de gerência e diretoria, a gente tem uma preparação melhor porque as mulheres já foram para as universidades e já estão se preparando. No nível mais técnico, é muito importante que a gente busque mais instituições que fazem parcerias com as empresas para essas formações. Este é para nós o principal desafio, mas é algo que nós já enxergamos e estamos buscando saídas”, enfatiza Elbia Gannoum. 

No Rio Grande do Norte, que abrange um dos maiores potenciais eólicos do Brasil, a presidente confirma que a demanda por mão de obra na área pode favorecer a inserção do público femino no setor eólico, sobretudo, considerando a maior busca das empresas pelas práticas de ESG (Ambiental, Social e Governança). Em fevereiro deste ano, a AES Brasil, empresa associada à Abeeólica, inaugurou a primeira especialização técnica voltada exclusivamente para mulheres no Estado em parceria com o Senai/RN e anunciou que o Complexo Eólico Cajuína, que pertence a empresa, será 100% operado por mão de obra feminina. 

Na ótica de Elbia Gannoum, o trabalho deverá impactar positivamente a população local e servir de espelho para outras empresas. “A iniciativa vai deixar um forte legado para essas mulheres que moram em regiões próximas aos empreendimentos. Gerar emprego e renda para mulheres faz parte da transição energética justa e de uma verdadeira transformação social, incluindo uma significativa parte da população que antes não tinha muita oportunidade de carreira. Vai ser uma experiência muito importante e que poderá ser adotada e reproduzida em outros estados e, quem sabe, por outras empresas do setor”, pontua.

Embora a Associação  não tenha estudos prontos sobre a participação feminina no segmento eólico, tendo em vista que essas estatísticas exigem um horizonte temporal, a presidente da instituição adverte que as empresas têm demonstrado atenção em relação ao tema. Um marco temporal importante para isso ocorre em 2020. Neste momento, aponta a Elbia Gannoum, o setor financeiro das empresas passa a lançar olhares para o tema social e, dentro deste, as pautas de diversidade e inclusão nos setores da economia. 

Os dados mais recentes do IRENA sobre a participação do público feminino nas energias renováveis, em especial, constam no relatório “Renewable Energy: A Gender Perspective” e traz estimativas referentes ao ano de 2019. Naquele momento, a proporção de mulheres que ocupavam cargos no segmento de energias renováveis era de aproximadamente  32%, enquanto no setor de energia em geral o percentual caiu para 22%.  Além disso, nas áreas de energias alternativas, a representação feminina em trabalhos de ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM) era muito menor em comparação a  empregos administrativos. 

Apesar do setor de energia ser majoritariamente masculino, a presidente da Abeeólica explica que o de renováveis, por ser recente, apresenta um viés mais moderno. “Pensando em energia eólica, a gente não está falando de mais de 20 anos globalmente de uma indústria viável”, destaca. Segundo ela, a Associação tem observado  iniciativas pontuais das empresas ao lado tanto de  instituições de pesquisa quanto de institutos de inovação e treinamento para  qualificar mais mulheres para o exercício no campo de energia renovável. 

“Aqui na Associação [Abeeólica], eu pessoalmente trato desse tema e a gente tem feito um esforço muito grande para o aumento dessa participação. Agora, quando esses esforços são feitos, os resultados demoram um pouco. Então, em dois ou três anos, a gente vai começar a perceber ainda mais os efeitos dessas políticas que estão sendo feitas agora”, esclarece.  Fora a AES Brasil, ela destaca o trabalho de empresas como a Engie, EDP e Equinor, além de iniciativas como o “Sim, Elas Existem”, “Mulheres na Energia”,  programas de mentoria como do GWEC (Global Wind Energy Council) e o “The Women In Wind Global Leadership Programme”.

Capacitação como porta de entrada 

No Rio Grande do Norte, o SENAI atua como indutor da inserção de mulheres no setor. O trabalho funciona mediante a  oferta de capacitações e de um projeto pioneiro do estado: o Interligadas, realizado no Centro de Tecnologias do Gás e Energias Renováveis (CTGAS-ER) da instituição. O objetivo é fomentar o trabalho de empresas, escolas, instituições e profissionais na busca pela igualdade de gênero no ramo. O trabalho é uma iniciativa da Rede de Mulheres na Energia Solar (MESol) e do Projeto Profissionais do Futuro, realizado pelo Ministério da Educação (MEC) e pela Cooperação Brasil-Alemanha para o Desenvolvimento Sustentável, por meio da Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit (GIZ) GmbH.

Amora Vieira, assessora de Mercado e Projetos do SENAI-RN, responsável por liderar ações relacionadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da instituição, observa que o foco pela participação feminina na área acompanha a realização do evento “Mulheres de Energia” em 2017. Na ocasião, mais que debates sobre o assunto, profissionais foram convidados para contar suas experiências e inspirar as alunas do novo ensino médio. Nesse momento, esclarece, a equipe voltada à entrega de educação profissional no Senai enxergou a necessidade de repensar estratégias para engajar mulheres nas carreiras tecnológicas.

A urgência também vai ao encontro de um cenário recorrente nos cursos de energias do Senai: a presença majoritária de homens. Segundo Amora Vieira, as capacitações técnicas nesse segmento apresentam forte potencial de empregabilidade na Indústria, o que estimulou um direcionamento mais assertivo da Instituição para atrair o público feminino. “Então a gente pensou: precisamos dizer para as meninas e mulheres que elas podem enxergar essa área como uma possibilidade. Ah, quer ser psicóloga? Quer ser uma administradora, uma médica, ou uma advogada? Show. Mas elas também podem ser uma técnica em eletrotécnica, ou uma engenheira mecânica”, enfatiza. 

Ela adverte, ainda, que não trata-se de um trabalho com prazo de validade, mas de ações contínuas capazes de possibilitar a análise dos indicadores sobre a participação de mulheres nos cursos de energias renováveis. O resultado disso é a repercussão e replicação das ações da unidade Senai no Rio Grande do Norte para outras regiões. Além da atuação em rede, a instituição recebe demandas de empresas que estão investindo no estado para formar mulheres nas áreas de energias renováveis, seja por meio de especialização, qualificação, ou cursos técnicos. 

Para Rodrigo Mello, diretor do SENAI-RN e do Instituto SENAI de Inovação em Energias Renováveis (ISI-ER), apesar da dependência pela mão de obra masculina e força bruta  ter perdurado por muito tempo, o vigente  setor de energia apresenta caráter tecnológico. “É um setor automatizado e com muita instrumentação. São nomes próprios de desempenho a partir do cérebro e não das mãos. Não tem razão para as mulheres ficarem de fora. É fundamental a contribuição feminina para o bom desenvolvimento desse ambiente. As empresas já entenderam isso e começaram a desenvolver soluções que buscam otimizar o desempenho a partir da participação feminina”, destaca.

Uma visão semelhante é partilhada por Amora Vieira. De acordo com ela, os empreendimentos já estão em uma procura real pela equidade de gênero e  enxergam na instituição uma solução para qualificar mulheres que poderão seguir uma carreira tecnológica. Na prática, as empresas entram em contato com o Senai, solicitam uma turma com um número específico de participantes e a instituição parte para o trabalho de articular a capacitação, o processo de seleção e a entrega para o público-alvo.

Apesar do engajamento da audiência feminina ser alto nessas ações, passos ainda precisam ser dados para alcançar o cenário ideal. “A gente percebe que há um interesse das mulheres em participar, mas poderia ser mais? Poderia. É perceptível que há o interesse em seguir nessa carreira, em atuar na área tecnológica, mas precisamos aumentar e fomentar novas oportunidades para que se tenham mais chances, turmas, processos seletivos e posteriormente mulheres formadas para ingressar nessas carreiras”, argumenta a assessora de Mercado e Projetos. Embora as capacitações não sejam uma garantia de entrada imediata em uma empresa, chama atenção, ela é o primeiro passo a ser dado. 

Segundo levantamento do SENAI/RN, entre os anos 2013 e 2020, 10,72% das matrículas na instituição em cursos ligados à energia, incluindo as renováveis, foram realizadas por mulheres com 19 a 72 anos de idade. Do grupo, a presença de mulheres pardas e brancas somam o maior percentual com, respectivamente, 50,67% e 41,55%. No que se refere à situação ocupacional, as alunas desempregadas são maioria com 39,17% ante 35,02% de empregadas. Para chegar a uma análise mais específica do panorama, de acordo com Amora Vieira, há um banco de dados da Instituição no qual estão sendo levantadas informações sobre o perfil socioeconômico das alunas. A previsão é que os resultados sejam consolidados até o fim de abril deste ano. 

Pioneirismo e representação 

Se, por um lado, os indicadores ainda estão em construção,  personagens reais estão presentes para contar suas histórias. É o caso de Ana Carolina, de 22 anos, técnica em Automação Industrial pelo Senai-RN e em Eletrotécnica pelo Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN). Ela é, também,  a primeira aprovada na Especialização Técnica em Manutenção e Operação de Parques Eólicos para mulheres oferecido pelo SENAI em parceria com a AES Brasil. “Eu queria muito fazer o curso, pois ainda não estou na área de renováveis e acho que esse será meu início para migrar para esse campo. O nosso estado tem esse grande potencial tanto para energia eólica quanto solar”, compartilha. 

O pioneirismo da jovem, contudo, vem antes da recente conquista. Em setembro de 2021, começou a trabalhar como operadora de Mudlogging, na área de petróleo, sendo a primeira da empresa a ingressar na função. Antes dessa experiência, já tinha atuado como aprendiz e estagiária em eletrotécnica e no planejamento e controle de manutenção em uma indústria  de bebidas. Para ela, a esperança é que o mercado de energias, tecnologia e engenharias priorize cada dia mais a participação feminina em seu quadro social. 

Filha de um mecânico e irmã de um eletricista, ela quer ser a voz feminina que inspira outras mulheres . “Como agente no setor na área de tecnologias, pretendo inspirar outras mulheres a não desistirem, continuarem e buscarem especializações e cursos. A gente precisa de exemplos”, ressalta. Por hora, o recado dela é para que as mulheres continuem na caminhada, pois embora as batalhas sejam muitas, o espaço do mercado de energias e tecnologias também é e deve ser ocupado pelo público feminino.

Em uma fase diferente da vida, Giovana Gomes, de 16 anos, cursa o 2º ano do ensino médio em uma escola pública de Natal, mas já lança olhares para o mercado de energias renováveis. Contemplada pelo projeto Interligadas, ela conta que teve os primeiros contatos com a área a partir do Fórum de Energias Renováveis. O evento ocorreu em Natal e abordou, dentre outros aspectos, os desafios e oportunidades para a atividade de energias renováveis,  empregabilidade, profissões do futuro, diversidade e inclusão no mercado. 

“Antes eu queria ingressar na área de Direito para ser advogada, mas depois dessa experiência que tive no Fórum passei a ter o interesse de ser técnica em energias renováveis”, destaca.  Apesar do contato com representações femininas durante o evento terem lhe proporcionado muita inspiração, esse não é o único combustível  que a move em sua jornada. “Quero ser a primeira da família a me formar e, também, mostrar que as mulheres tem sim como conquistar o seu lugar”, complementa. 

fonte: https://tribunadonorte.com.br/economia/energias-renovaveis-presidente-da-abeeolica-destaca-necessidade-da-participacao-feminina-em-toda-cadeia-produtiva/

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